Apesar de a fragilidade da legislação ser apontada como um dos fatores que contribuem para a corrupção no País, projetos de lei que visam ampliar a punição aos corruptos e a fiscalização sobre os gastos públicos permanecem estagnados no Congresso há quase uma década. Parlamentares cearenses admitem a dificuldade para aprovar matérias sobre o tema, mas defendem que o Brasil começa a vivenciar um momento político que pode acelerar as soluções.
Nos últimos nove anos, vários pacotes anticorrupção foram apresentados tanto na Câmara quanto no Senado com o objetivo de combater os crimes contra a administração pública. Motivada pela veiculação de esquemas de desvio de verbas, a maioria das propostas segue sem entrar em votação nas duas Casas.
A queda de pelo menos seis ministros por suspeita de envolvimento em crime contra o erário, no ano passado, motivou o retorno da discussão sobre o tema no Congresso. O senador Pedro Taques (PDT/MT) apresentou mais de trinta projetos, ao que ele chamou de pacote anticorrupção, para aumentar as punições a corruptos e a transparência da gestão pública.
Improbidade
Ainda no ano passado, a Frente Parlamentar Suprapartidária de Combate à Corrupção no Senado começou a trabalhar na preparação de um pacote de medidas para combater esse tipo de crime. A ideia era enrijecer as leis para combater a impunidade. Dessa forma, o debate iniciado incluiu propostas para garantir a responsabilização criminal de corruptores, suprimir de foro privilegiado para autoridades em processos criminais, rito especial para processos de improbidade, fim do voto secreto e fim das emendas parlamentares individuais ao Orçamento.
A expectativa era de que o pacote anticorrupção sugerido por Taques fosse apreciado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado no ano passado, o que não ocorreu. Também estava prevista a apresentação do relatório da Frente Parlamentar, propondo projetos para combater os crimes contra a administração pública. O grupo chegou a se reunir com algumas instituições para tentar aproximar a discussão da sociedade, mas acabou adiando a entrega do relatório para este ano.
Prescrição
A sugestão de um conjunto de projetos para combater a corrupção, no entanto, não é novidade. Em 2003, o senador Demóstenes (DEM/GO) apresentou o pacote de nove propostas enrijecendo as penas para esse tipo de crime. Duas das iniciativas foram aprovadas e agora aguardam apreciação da Câmara Federal: a que aumenta o prazo de prescrição e a que amplia as penas para crimes de colarinho branco. As demais estão arquivadas ou aguardam designação de relator na CCJ.
O senador cearense Eunício Oliveira, que preside essa Comissão de Constituição e Justiça, afirmou não ter dificuldade de colocar esse tipo de assunto em debate. O parlamentar disse ter solicitado à sua assessoria um levantamento de projetos de vários temas que estão paralisados para colocar na pauta da CCJ e, dentre os assuntos, está o combate a corrupção.
Pareceres
"Eu tenho dito sempre deputados e senadores foram eleitos para debater os interesses da sociedade. Se há corrupção, temos que achar um caminho para combatê-la", declara. Segundo Eunício, uma série de projetos sobre o tema está sendo distribuída entre os relatores e, tão logo sejam dados os pareceres, o senador cearense diz que colocará as matérias em pauta.
"Em relação à CCJ, não tem gaveta para esse tipo de projeto", pondera. Eunício Oliveira acrescenta ainda que vê com certa preocupação algumas questões entre as Casas Legislativas do Congresso, considerando "ruim" o rito de projetos aprovados pelo Senado que ficam parados na Câmara e vice-versa.
Além das discussões no Senado, outros projetos e pacotes contra a corrupção foram apresentados na Câmara Federal. Em 2007, por exemplo, líderes partidários na Casa iniciaram a discussão sobre um conjunto de propostas para combater crimes contra o erário, após a deflagração da Operação Navalha pela Polícia Federal para investigar esquema de fraude em licitações envolvendo parlamentares, governadores e prefeitos.
Mensalão
Além das proposituras de deputados e senadores, o Governo Federal também sugeriu mensagens sobre o assunto. Em 2010, após o chamado mensalão do DEM, o então presidente Lula enviou ao Congresso Nacional um projeto de lei propondo penas mais duras para corruptos e corruptores.
Embora movimentos de combate à corrupção tenham ganhado força em 2011, a grande maioria das propostas que tratam do tema continua parada na Câmara e no Senado, sem previsão para entrar em votação. Diante disso, parlamentares cearenses dizem que o momento político pressiona pelo aumento ações de combate à corrupção, mas defendem que é preciso discutir soluções amplas e a longo prazo
Argumentando que proposituras com embasamento ético costumam sofrer pressão natural da população para entrar em pauta, o deputado federal Mauro Benevides (PMDB) acredita que as mudanças na legislação com o objetivo de combater crimes de corrupção ocorrerão no momento adequado. Ele cita a aprovação da Lei da Ficha Limpa, motivada pelo engajamento de entidades da sociedade.
Delicadas
"Matérias dessa natureza são delicadas porque envolvem vida política e partidária, mas podemos dizer que houve avanços, principalmente pela consciência que prevalece hoje no Congresso", declara o parlamentar. E acrescenta: "A opinião pública pode ficar tranquila que essas mudanças virão".
Benevides diz que há pré-disposição dos deputados para concretizar essas mudanças, mas também admite a descrença da população diante da demora para a votação das proposituras. Por outro lado, ele diz que a aprovação e a validação da chamada Lei da Ficha Limpa começa a mudar essa sensação. "Começa a sinalizar a nova etapa pela qual passa o Congresso", alega o parlamentar cearense.
Descrença
O deputado federal Chico Lopes (PCdoB) concorda que há descrença da população, principalmente por conta do número de escândalos de corrupção que vem ocorrendo. "Às vezes, não se prova nada, mas as pessoas ficam descrentes. E com justa razão", considera. Ele diz que os exemplos dados por alguns políticos não têm sido os melhores, por isso é preciso garantir mais agilidade a julgamentos de crimes contra o erário e mesmo de às prestação de contas das gestões públicas.
Conforme Chico Lopes, nem sempre os parlamentares conseguem pautar os temas que querem no Legislativo. "Primeiro, qualquer matéria só vai para votação se o presidente (da Casa Legislativa) quiser. Independente de pressão dos parlamentares, isso é regimental. As pautas do legislativo pouco têm projetos e iniciativas realmente do parlamentar", explica.
O deputado federal defende que é preciso promover mudanças no sistema político tanto para combater a corrupção quanto para garantir os direitos básicos da população através de uma constituinte. Ele lembra que, em alguns países, o Executivo não apresenta projetos, entendendo que a tarefa cabe ao Legislativo.
"Temos que mudar sistema politico-eleitoral para conseguirmos uma coisa mais duradoura. Mas tem muitos de nós políticos que não querem. Alguns são beneficiados do jeito que está", lembra o parlamentar.
Transparência
Para o senador Eunício oliveira (PMDB), o combate à corrupção envolve dois caminhos: a maior transparência dos atos da administração pública e o aumento da punição sobre esse tipo de crime. "Vamos debater na reforma do Código Penal algumas questão relacionadas à impunidade. Há um novo conceito de sociedade hoje, mais plural, aberta e transparente. Tem que ter penalidade, mas também tem que ter transparência", argumenta o senador.
SAIBA MAIS
Em 2003, o senador Demóstenes (DEM/GO) apresentou um pacote com nove propostas para combater a impunidade em casos de corrupção. Dentre os projetos, foram aprovados um que aumenta o prazo para a prescrição desses crimes e outro que amplia as penas aos corrutos. Ambos foram enviados à Câmara. As demais propostas foram arquivadas ou aguardam relator na CCJ.
No pacote anticorrupção apresentado pelo senador Pedro Taques (PDT/MT), em 2011, estão leis que definem novas exigências para o repasse de verbas a ONGs, que impedem que senadores e deputados federais ocupem cargos de ministros ou equivalente e que obrigam a publicação dos atos da administração direta e indireta.
A Frente Parlamentar Suprapartidária de Combate à Corrupção no Senado iniciou, também em 2011, debate para formatar um conjunto de medidas anticorrupção. Na discussão, foram sugeridas propostas para suprimir o foro privilegiado de autoridades em processos criminais, para rito especial em processos de improbidade, para o fim do voto secreto e o fim das emendas parlamentares individuais.
Beatriz JucáRepórter
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