Gustavo Licínio, filho de metalúrgico, é monitor no laboratório multimídia na escola onde estuda. Jaílson da Cruz é motoqueiro, trabalha como entregador e se mantém informado pelo celular. Jaqueline Diógenes usa o aparelho para saber mais sobre a faculdade que pretende cursar. José Agecilanes ganha dinheiro com serviços online de retirada de CPF e envio de currículos para empresas. Histórias diferentes, que revelam hábitos os mais variados. Mas com um único pano de fundo: o uso das mídias digitais, baseadas na Internet. O que chama ainda mais a atenção são as localidades onde essas situações ocorrem.
Engana-se quem pensa que sejam personagens de grandes metrópoles, como Fortaleza, onde o uso e as possibilidades da Internet e seus derivados são cada vez mais comuns e sofisticados. Forte tendência em cidades do Interior do Ceará, essa realidade vem mudando o comportamento de grande parte da população, alterando, também, a visão que tem do mundo.
Município de Paraipaba, a 93 km da Capital. Colégio Ageu Romero. Entre um tempo e outro de aula, a sala de informática fica lotada de alunos. Nesse intervalo, pesquisas escolares, bate-papos, músicas e vídeos passam a fazer parte da rotina. Entre os alunos, destaca-se o morador do distrito de Camboas, a dez quilômetros da sede do município. Com 18 anos de idade e cursando o terceiro ano do Ensino Médio, Gustavo é quem orienta e tira dúvidas dos colegas.
A naturalidade com que o monitor atende aos chamados mostra que o mundo digital faz parte do dia a dia do estudante. Com celular que acessa a Internet na mão e fone nos ouvidos, Gustavo diz que o aparelho funciona para ele como uma espécie de central de entretenimento, com direito a escolher o que quer curtir.
“Eu mesmo baixo o que gosto de ouvir”, exemplifica, dizendo ser apreciador mais de rock e reggae. Resultado: Gustavo deixou de sintonizar as rádios locais e da região do Curu. Em vez disso, passou a colecionar em seus links favoritos vários endereços de sites e blogs de emissoras digitais preferidas.
O mesmo vale praticamente para outro tipo de veículo de comunicação tradicional, a TV. “Eu assisto muito pouco. Pouco mesmo. Só à noite, antes de dormir”, conta o estudante. Os vídeos que lhe interessam, conta, ele diz pegar diretamente da Internet. Quem imaginava isso no Interior poucos anos atrás?
Não foi só no gosto musical e de vídeos que a televisão perdeu espaço na vida de Gustavo. Na casa muito simples dos pais dele, a dez quilômetros da sede do município, O POVO constatou que um computador de mesa, comprado a prestação cinco meses atrás, ocupa lugar privilegiado na sala de estar. O equipamento acabou destronando o aparelho de TV, agora relegado a segundo plano.
A transformação não para aí. As parabólicas, uma febre em pequenas cidades Ceará afora há até pouco tempo, agora convivem com outros tipos de antena: as que garantem as conexões de Internet e sinal de celular.
De tão disseminado na rotina de Gustavo, o mundo digital começa, aos poucos, invadir a vida da irmã, a pequena Raíssa, de cinco anos de idade. Quem conta é a mãe dos dois, dona Roseni Silva, de 38 anos. Alheia ao mundo da informática, ela fala com orgulho do envolvimento dos filhos com o computador e a Internet. “Às vezes ela grita: ‘mãe vem ver os Rebeldes”, imita dona Roseni.
Distante da grande rede de computadores e de suas facilidades, a mãe do casal não pode dizer o mesmo da telefonia, muito usada nos primórdios da Internet no Brasil - quando as lentíssimas conexões ainda eram discadas.
Sem telefone fixo em casa, dona Roseni adquiriu um aparelho celular, através do qual fala com todos os membros da família. Um indício de que, de uma forma ou de outra, a dona de casa pode até não perceber, mas também está inserida no mundo digital.
ENTENDA A NOTÍCIA
O Interior não é mais como era antigamente. Ele também está online. A desinformação deu lugar à conectividade. Na rotina, celular com Internet, lan houses lotadas. A televisão da sala perdeu status. Agora, quem reina é o computador.
O Povo
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